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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Antro recomenda em Beagá: nova pesquisa de fôlego, Palomar!


C O N V I T E
O Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais
convida V.Sa. para sessão pública de apresentação e
defesa de tese:



A LEI DO DESEJO: AS RELAÇÕES DE GÊNERO NO
CINEMA DE PEDRO ALMODÓVAR.


CANDIDATA: Paloma Ferreira Coelho Silva
 
COMISSÃO EXAMINADORA:
Profa. Dra. Juliana Gonzaga Jayme – (Orientadora) - PUC Minas
Profa. Dra. Debora Breder Barreto – UCAM
Profa. Dra. Claudia Andréa Mayorga Borges – UFMG
Profa. Dra. Maria Ignez Costa Moreira – PUC Minas
Profa. Dra. Alessandra Sampaio Chacham – PUC Minas


DIA/HORA: 29/02/2016, 2ª feira, com início às 14:00 horas 

LOCAL: Av. Itaú, 505 – 4° andar – Bairro Dom Cabral – Belo Horizonte/MG 
Tel.: 3411- 5162
na Movida Madrilenha...

sábado, 13 de fevereiro de 2016

Repúdio aos cinemas comerciais de Florianópolis


Carta de repúdio aos cinemas comerciais de Florianópolis/SC que ainda não se manifestaram quanto à exibição do filme “A Garota Dinamarquesa”

ADEH 

Envio de Lirous K’yo Fonseca Ávila.

A ADEH – Associação em defesa dos direitos humanos com enfoque na sexualidade veio por meio desta carta mostrar a nossa indignação contra os cinemas comerciais de Florianópolis/SC que não irão exibir o filme “A Garota Dinamarquesa”. A ADEH é uma instituição que foi fundada por travestis e transexuais da grande Florianópolis a mais de 23 anos e desenvolve um trabalho social com toda a população. Sua constituição é majoritariamente composta por mulheres travestis e mulheres transexuais que trabalham de forma voluntária sem nenhuma ajuda governamental realizando o trabalho que por obrigação deveria ser do estado de Santa Catarina e do município de Florianópolis.

Como trabalhamos com a realidade social das pessoas travestis, transexuais e transgêneras, resolvemos no ano passado criar um evento no facebook chamado OcupaAdeh que tinha como proposta central emponderar e levar a população trans (homens e mulheres transexuais e transgêneros)/ mulheres travestis para as salas de cinema de forma a fazer com que conheçam e sintam familiarizadas com o espaço do cinema/shopping que é restrito a população trans/ mulheres transexuais por imposição social. Há pouco tempo, um dos shoppings que possui um cinema, acabou sendo processado e tendo a causa ganha por uma mulher transexual que foi agredida dentro do shopping por utilizar o banheiro que correspondia ao seu gênero, logo o feminino. E não é de hoje que esses estabelecimentos tendem a violentar a população trans/ mulheres travestis quando ela ocupa espaços públicos.

Quando liguei para uma pessoa que se colocou como responsável pela programação para saber a respeito do filme, data de estreia e valores, ela me perguntou de forma rude e com desdém: “-Tá, mas porque vocês querem assistir a esse filme”?

Nós queremos que esse filme passe no cinema de Florianópolis porque é um dos poucos que retrata a história de uma mulher transexual de forma digna sem utilizar de estereótipos caricatos, deboches ou com apelos sexuais para nos representar.

Porque as pessoas ainda insistem em querer acreditar que só pelo fato de participarmos de um mesmo movimento social o LGBT, todas as letras que fazem parte são gays e isso inclui a população trans/ mulheres travestis. Acreditamos que com o filme, esse tipo de abordagem pode ficar mais claro e desmistificado.

Porque o filme trará um pouco de toda a dor e sofrimento que a população trans / mulheres travestis se deparam aos se descobrirem como pertencentes ao sexo oposto e que o mesmo não acontece com os héteros cisgêneros (As pessoas cisgêneras são aquelas que se conformam/identificam com o gênero que lhes foi compulsoriamente designado no seu nascimento. Ou seja, nasceu com um pênis, foi compulsoriamente designado como homem pelo discurso biomédico e se reconhece como homem; nasceu com vagina, foi compulsoriamente designada como mulher pelo discurso biomédico e se reconhece como mulher”.) que em nenhum momento da vida precisam se descobrir nessa condição, fora que a condição de heterossexual cisgênero é privilegiada, tida como normal e não sofre de heterofobia, já que nenhum heterossexual morre por ser heterossexual diferente da população LGBT que morrem por serem quem são.

Porque a nossa população de mulheres transexuais e de mulheres travestis tem a expectativa de vida de 30 anos e o Brasil é o país que mais mata a população trans/ mulheres travestis, matando cinco vezes mais que o país que fica em segundo lugar na matança da população trans/ mulheres travestis no mundo.

Porque desde que iniciou o ano de 2016, pelo menos 47 pessoas trans/ mulheres travestis foram assassinadas e todas com requintes de crueldade e a maioria dos casos continua sem solução. O assassino pode estar lendo isso agora, pode ser o seu marido, filho, amigo, vizinho, etc…

Porque a população trans/ mulheres travestis é a que mais “comete suicídio”, mesmo eu tendo a certeza de que a falta de oportunidades, a falta de acesso a bens e serviços (como os da assistência social e a saúde), preconceitos e violências levam as pessoas a concluírem o seu “próprio homicídio” causado pela falta de amparo do Estado e do movimento LGBT.



Porque não há políticas públicas de inclusão da população trans/ mulheres travestis nas escolas, unidades de ensino (universidades, escolas técnicas, ensinos profissionalizantes, etc…) e no mercado de trabalho, fazendo com que muitas que não desejam, sejam submetidas à prostituição como única fonte de reprodução de vida (arrecadar dinheiro para a sua existência), com a falta de segurança, muitas são assassinadas e acabam mortas no seu local de trabalho.

Porque além de todo o trabalho que chega a instituição ADEH, desde pessoas vítimas de violência, que necessitam de acompanhamentos psicológicos ou jurídicos que ofertamos a toda a população de forma gratuita, não é raro chegar demandas de mulheres trans/ mulheres travestis que tem medo de comprar um milk shake por exemplo, por causa do preconceito que sofrem na rua e nos estabelecimentos mesmo sendo clientes, e pedem para que um dos membros da instituição as acompanhe até os estabelecimentos para efetuar suas compras.

Porque a maioria das pessoas trans/mulheres travestis não costumam ocupar espaços públicos por medo de represarias e de violências o que faz com que muitas se sintam seguras a sair somente de madrugada.

Porque o estado de Santa Catarina demora a reconhecer, quando reconhece, pois é uma sentença rara a acontecer, a mudança do nome e do gênero nos documentos de identidade do requerente que entra com processo judicial para sua retificação, impedindo que a população trans/ mulheres travestis tenham acesso digno a escola ou ao mercado de trabalho quando são mais “passáveis” como costumam denominar aqueles/aquelas que mais são parecidas com homens ou mulheres reforçando estereótipos de gêneros.

Porque diferente dos outros estados, muitos médicos de Florianópolis se negam ou tratam com hostilidade e desrespeito a população trans/ mulheres travestis ridicularizando-as e fazendo com que as mesmas evitem os serviços básicos de saúde.

Porque muitas mulheres transfóbicas que se dizem militantes contra as opressões de gênero e se intitulam “RADFEMES” perseguem pessoas trans/ mulheres travestis nos espaços acadêmicos fazendo com que muitas desistam de estudar, tendo que ser obrigadas a conviver com mensagens de “boas-vindas” nos banheiros femininos como “Morte aos travekos” ou ter o nome de registro exposto em alguma página do facebook ou pichação na rua.

Porque muitas pessoas da população trans/ mulheres travestis são expulsas de casa ainda jovens e acabam ficando em situação de rua, sem perspectiva de uma vida com dedicação aos estudos e ao trabalho para realizar o sonho que toda a criança tem “de ser o que quiser quando crescer”.

Porque a mídia não respeita a população trans/ mulheres travestis. A grande maioria dos jornalistas ignorantes com os estudos de gênero aos quais é possível ter acesso dentro da própria academia já que as nossas universidades são referências mundiais em estudo de gênero, mesmo assim firmam tratar gênero por sexo biológico, chamando de “O travesti” quando na realidade pode ser uma mulher transexual ou uma travesti, pois o “termo” “O travesti” é desrespeitoso com a identidade de gênero do indivíduo, assim como “A lésbica sapatão” ao se referirem aos homens transexuais. Além de serem responsável por contabilizar de forma errada as mortes da população trans/ mulheres travestis já que todas são tratadas como “O homem vestido de mulher é assassinado”, ou “Um gay com roupas femininas foi encontrado morto” o que aumentam somente as estatísticas de morte referente aos gays mesmo a população trans / mulheres travestis na sua grande maioria não sendo gays e invisibilizam as mortes da população trans/ mulheres travestis. Fomentando com esses termos ainda mais a violência e a morte da nossa população.

Porque ainda a população trans/ mulheres travestis são vistas como objetos sexuais e colocadas à margem da sociedade por aqueles que nos negam empregos durante o dia, mas pagam para sair conosco durante a noite, quando não nos matam depois da relação sexual pelo simples fato de despertarmos desejos sexuais e fazermos com que ele se sintam menos “homens”. Bem, sabemos que a maioria dos assassinos de mulheres transexuais e mulheres travestis tentam matar nelas aquilo que não conseguem matar dentro deles próprios.

Porque somos vistas como “pedófilas”, “pederastas” e incentivadoras do “homossexualismo” culpadas pelo crime de organizar uma “ditadura gay” para destruir com a família tradicional brasileira.

Porque as unidades de ensino resolveram retirar dos planos municipais e estaduais da educação a discussão de gênero que poderia fazer o enfrentamento e o combate ao preconceito no nosso país.

Porque os nossos líderes religiosos ganham muito dinheiro com a proposta de curar gays e pessoas transexuais/ mulheres travestis, e utilizam das nossas fraquezas como moeda de troca, como um meio de capitar recursos financeiros em troca da tão sonhada “cura” que representa para muitas a aceitação social por sermos quem somos ao invés de proporcionar aquilo que a religião prega que é a paz de espírito e o amor ao próximo.

Porque muitas das meninas nunca estiveram em uma sala de cinema. E como este filme nos representa, gostaríamos de ajudar a contribuir mesmo que com pouco para mostrar o nosso reconhecimento as pessoas que fazem um trabalho de serviço a população trans/ mulheres travestis com dignidade e respeito, o que raramente acontece no mundo todo.

Poderia citar muitos motivos pelo qual motivaram a idealização desse projeto. Lamento que não vamos conseguir por enquanto realizar o nosso sonho, que era de levar pelo menos 10 pessoas trans/ mulheres travestis até o cinema, comer pipoca assistindo o filme “A Garota Dinamarquesa” e tirar fotos ao lado do pôster do filme, pois nem isso foi posto em nenhum cinema, porque diferente de outros estados, em Santa Catarina nos somos um segredo, muito requisitado nas esquinas e mantido por aqueles que se dizem não se misturar com “isso”. Só lembrando que quem procura, minimamente tem carro e dinheiro para pagar o programa e o motel que não é barato, logo sabemos muito bem de que classe que estamos falando. Pois os homens pertencentes a essa classe tem medo de se deparar com a população trans/ mulheres travestis que eles procuram à noite às escondidas, nos mesmos espaços públicos que eles frequentam com as suas famílias e amigos, temem que os seus segredos sejam revelados.

 
publicado originalmente em:  http://desacato.info/adeh-faz-carta-de-repudio-aos-cinemas-comerciais-de-florianopolis/