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terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Maranhão 66, Glauber Rocha. (Brasil, 1966)

 Via Carmen Castro
No Maranhão #Não vai ter copa! Glauber sabia desde 1966.


ZECA BALEIRO

Leio com assombro as notícias que chegam do Maranhão. Imagens e relatos dolorosos e repugnantes despejados em tempo real em sites, jornais e telejornais, escancarando a nossa vergonha e impotência diante de barbaridades que já
extrapolam nossas fronteiras e repercutem mundo afora.

Como todos, estou pasmo. Mas nem tanto. Nasci no Maranhão e sei que a barbárie (a todos agora revelada de um modo talvez sem precedentes) já impera há anos na prática de seus governantes vitalícios, que agem como os velhos donos das capitanias hereditárias do passado.

Se o crime organizado neste momento dá as cartas e oprime o povo com ameaças e ações dignas dos mais perigosos terroristas, é porque há uma natural permissão --a impunidade crônica dos oligarcas senhores feudais, que comandam (?) o Estado com mãos de ferro há 47 anos (a minha idade exatamente) e que, ao longo desse tempo, vem cometendo atrocidades sem castigo, com igual maldade, típica dos grandes tiranos e ditadores.

Esses donos do poder maranhense (e nunca dantes a palavra "dono" foi empregada com tanta adequação como aqui e agora) são exemplo e espelho para que criminosos ajam sem nenhum medo da punição.

Pois a miséria extrema que assola o Estado há décadas, o analfabetismo estimulado pela sanha dos coiotes ávidos de votos, a cultura antiga de currais eleitorais, a corrupção mais descarada do mundo e o atentado ao patrimônio histórico de sua bela e triste capital são crimes tão hediondos quanto os cometidos no complexo penitenciário de Pedrinhas.

A diferença crucial é que, enquanto os bandidos que agora aterrorizam (e matam) a população aos olhos assustados da nação estão em presídios infectos e superlotados, os criminosos de colarinho branco (e terninho bege) habitam palácios.

No meio do caos, soa tão patética quanto simbólica a notícia veiculada dias atrás pelos jornais sobre abertura de licitação para o abastecimento das residências oficiais da governadora.

A lista de compras é de um rigor e de uma opulência espantosos. Parece coisa da monarquia francesa nos dias que antecederam sua queda.

No presídio de Pedrinhas, cabeças são cortadas. Resta saber se, para além dos muros da prisão, alguém um dia irá para a guilhotina.


ZECA BALEIRO é cantor e compositor maranhense


Um comentário:

  1. Um documento vazado pelo Wikileaks em 2009 não mereceu nenhuma atenção da mídia e nem do governo. É uma pena, porque ele tem um imenso interesse público. No documento, o Wikileaks fala de um dinheiro que Roseana Sarney, governadora do Maranhão, teria nas Ilhas Caimãs, um dos mais notórios paraísos fiscais do mundo. Roseana, segundo o Wikileaks, tinha em 1999 cerca de 150 milhões de dólares em Caimãs. Em reais, seriam cerca de 350 milhões em valores de hoje.
    Dinheiro em paraíso fiscal é uma tragédia para a economia de um país. Primeiro, e acima de tudo, porque significa sonegação de impostos. É com o dinheiro dos impostos que você constrói escolas, hospitais, estradas,portos, aeroportos e outras coisas que são absurdamente escassas, por exemplo, no Maranhão. Depois, porque o envio de dinheiro para fora revela falta de confiança no país. Isto é ainda mais doloroso quando se trata de pessoas que comandam o país.
    É um sinal de que tais pessoas sabem que estão fazendo um serviço abjeto em seus cargos públicos. Um estudo escrito por James Henry, ex-economista-chefe da consultoria McKinsey, mostra que os super-ricos brasileiros tinham, em 2010, cerca de 520 bilhões de dólares (ou mais de 1 trilhão de reais) em paraísos fiscais. É quase um quarto do PIB nacional.
    O trabalho foi encomendado pela Tax Justice Network (TJN), organização que combate os paraísos fiscais.
    “Quando vejo os ricos brasileiros reclamando de impostos, só posso crer que estejam brincando. Porque eles remetem dinheiro para paraísos fiscais há muito tempo”, afirma John Christensen, diretor da TJN. As coisas ficam ainda mais complicadas quando você olha para uma conta num paraíso fiscal e se pergunta: como o titular acumulou tanto dinheiro?
    Vejamos um exemplo sem essa condição agravante. Na Alemanha, o presidente do Bayern, Oli Hoeness, caiu imeditamente em desgraça quando a revista Focus publicou que ele tinha uma conta secreta na Suíça. Hoeness não pagava imposto sobre o patrimônio escondido na Suíça, e isso foi suficiente para que fosse decretada sua prisão. Ele pagou uma fiança de 5 milhões de euros, cerca de 15 milhões de reais, para escapar provisoriamente da prisão. Em março, começa seu julgamento. Dificilmente ele vai se safar da cadeia.
    O governo alemão quer que ele seja punido exemplarmente por um motivo poderoso: você não constroi um país decente quando pessoas fazem o que Hoeness fez.Hoeness é um homem rico. Não causou estranheza o tamanho da conta suíça – mas o fato de ele não a ter declarado. É mais dura a situação quando você examina o documento do Wikileaks sobre Roseana. De onde vieram os 150 milhões de dólares denunciados pelo Wikileaks?

    Por que ninguém investigou o caso nestes anos todos? Sabemos os interesses da mídia. A Globo, particularmente, tem uma longa relação de amizade e parceria com a família Sarney no Maranhão.

    E o governo, por que não se movimentou? Uma hipótese é que a informação – embora pública – não tenha chegado a Brasília. Mas a alternativa mais real é a que diz respeito à assim chamada governabilidade.

    Mexer com os Sarneys – nem que fosse para meramente esclarecer um documento de elevado interesse público – é uma das últimas coisas que um governo que dependa do PMDB deseja.
    E então nada muda e nada acontece. O preço colossal é pago, como sempre, pela sociedade. os protestos de Junho mostraram que as pessoas estão cansadas dos arranjos políticos em volta da governabilidade – porque eles atrasam consideravelmente o desenvolvimento social brasileiro.
    A mensagem das ruas foi entendida? Se sim, é hora de enfrentar certas realidades desagradáveis. Se não, as ruas fatalmente voltarão a se manifestar – contra a mídia que só defende seus próprios interesses e contra a “governabilidade” que perpetua iniquidades históricas nacionais.

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